Há três motivos básicos para que os homens mintam:
vergonha, medo e calhordice.
Mas,
não se apavorem. Há um culpado, ou melhor, culpada. Toda vez que um homem
mente, deveria invocar a figura feminina mais ilustre de sua vida: sua mãe.
Sim, não tenham dúvidas, as mães são as grandes e verdadeiras culpadas pelas
mentiras dos homens. Então, como as mulheres podem ficar indignadas quando nós,
meros fantoches, somos compelidos, obrigados mesmo, a mentir. Elas, pelo menos
em teoria, são, foram ou serão mães.
Quando
bebês, tudo o que fazemos é bonitinho, engraçadinho e, então, jogamos comida
fora do prato, fugimos cambaleantes para não tomar o banho que naturalmente
queremos e, principalmente, dizemos ter medo do escuro só para ficar junto à
mamãe e atrapalhar a vida daquele canalha que dorme com ela.
Assim
começamos a mentir deliberadamente. E como tudo na vida tem um fim...
A
primeira vez que descobrimos que não somos mais bonitinhos, engraçadinhos, é
quando recebemos aquele olhar de reprovação, só porque jogamos uma colher de
comida na cara do cachorro que não tinha nada que estar perto da mesa na hora
do almoço. Crescemos e agora aquele olhar meigo, risonho e doce nos cobre de
humilhação e vergonha. E eu juro que foi sem querer.
Um
pouco mais velhos, descobrimos que aqueles braços macios têm força e que força!
Escondemos as notas da escola para fugir dos braços que espantam a preguiça do
corpo e nos ensinam, cruel ensinamento, que o estudo é que nos fará alguém na
vida. Não é por medo, não, mas eu juro que ainda não entregaram as notas.
Finalmente,
a duras penas, arrumamos uma namorada, aquela que irá nos devolver o carinho da
infância e que tudo o que fizermos será, para ela, bonitinho, engraçadinho,
como era com a mamãe. Exceto o sexo, nossa maior descoberta. E só então nos
damos conta que os gemidos que ouvíamos de madrugada no quarto ao lado, não era
o canalha batendo na mamãe. Era muito pior...
Porém,
assim como papai, o canalha, eu juro que a camisinha estourou.
Um
ano trabalhando no escritório de um velho ranzinza, torturador cruel, que
sempre nos repreende por chegar atrasado. A culpa não é nossa não, é do ônibus,
eufemismo para a mãe-esposa que não nos deixa pregar o olho reclamando que
falta isso, falta aquilo. Sentimos vergonha porque as mulheres que trabalham
conosco sempre chegam no horário, sempre sorridentes. É que elas não são
homens, graças a Deus, são mulheres apenas e nós, pobres vítimas de uma
sociedade patriarcal, mal conseguimos abrir um olho.
-
Sei que o senhor não vai acreditar, mas o ônibus teve um pneu furado quando eu
vinha para o trabalho. Eu juro!
Depois
já cansados da luta diária, sonhamos em mandar o velho viajar, ou se
preferirem, para a p... Mas, temos medo. Ficar sem emprego nos dias de hoje é
quase um suicídio.
-
Sei que o senhor não vai acreditar, mas o ônibus teve um pneu furado quando eu
vinha para o trabalho. Eu juro!
Com
o passar dos anos, melhoramos financeiramente e apenas financeiramente. O
patrão é o mesmo e sabe-se-lá-por-quê nos deu promoções ao longo da carreira,
afinal vinte anos não são vinte dias. Mas, com mil diabos, ele ainda não aceita
minhas desculpas:
-
Sei que o senhor não vai acreditar, mas o pneu do carro furou quando eu vinha
para o trabalho. Eu juro!
Vinte
anos não são vinte dias e muito menos trinta anos são trinta dias. Escorregamos
definitivamente no caos. Casa, mulher, filhos, cachorro, o chato do sogro como
patrão, trinta anos e o velho não morre nunca. Basta! Vamos a forra!
Happy
hour, cinco ou seis chopps depois, vem à nossa mesa uma mãe-mulher ou uma
mulher-mãe como queiram, para nos consolar trinta anos de solidão, trinta anos
em que nada do que fazemos é bonitinho, engraçadinho. Relutantes a convidamos
para sentar. Conversa vai, conversa vem... Queremos por um fim em tudo. Basta!
-
Você é casado?
-
Não, esta aliança é o último elo que sobrou entre mim e meus filhos.
Por isso
não a tiro.
-
Você ainda ama sua mulher, não?
-
Qual...
-
Pergunto isso, porque você parece assim... Tão triste...
-
Triste por estar sozinho há tanto tempo...
Seis ou sete chopps depois:
Motel. E o que fazemos? Nada.
Trinta
anos não são trinta dias.
-
Isso nunca me aconteceu antes...
Trinta anos!
-
Se você me der um tempo, eu consigo...
Trinta anos!
- Vamos marcar outro dia, eu
te ligo...
Chegamos
em casa às quatro ou quatro e meia da manhã...
-
Onde você estava?
-
Você não vai acreditar, mas o pneu furou e...
-
Mentiroso, safado, esta desculpa é velha.
-
Desculpe, querida (trinta anos não são trinta dias), estiquei com os
amigos e não
me dei conta das horas e...
-
Você não tem amigos, cachorro...
É
verdade, tanto tempo sozinho, colegas são poucos e nenhum é de confiança,
infelizmente. Trinta anos. E a mulher continua:
-
Diga a verdade, canalha, você estava com alguma prostituta. Você não
presta.
Não pensou em mim, não pensou nos filhos... vo...
você... você não me ama mais...
Pingos
nos is, saldos na balança. Resolvemos resgatar um fio de honestidade e honradez
que se esconde em algum lugar, mas onde?
-
Perdoe-me, meu amor, perdi o controle. Sai para desafogar, me envolvi
com
uma mulher... Fomos ao motel, mas eu juro, não
fizemos nada...
-
Não fizeram nada?... No motel?... Não fizeram nada?...
-
Tá bem, fiz tudo, tudo ouviu... Estou cansado e quero dormir. Boa
noite!
No outro dia, a vida
continua... Café, torrada, filhos na escola e a mulher... Bem, a
mulher, esposa e mãe, assim como todas as mães,
acaba nos perdoando mas... Do que mesmo?
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